sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Reflexão – “Pesadelo do Ter”


Li o texto abaixo no Jornal Metrô News, na edição de 27 de dezembro de 2012. É de autoria de João Baptista Herkenhoff que é escritor, palestrante, magistrado aposentado e professor universitário.

Ser ou ter, Niemeyer?

Os que comandam o imaginário popular propõem o consumo como meta de vida. O sistema econômico vigente tem, nos mecanismos de mercado competitivo, o fundamento de sua organização. O parâmetro de êxito pessoal, imposto pela cultura dominante, é possuir e consumir.

Contrapondo-se à cultura dominante, o filósofo Gabriel Marcel afirma que o “ter” é uma fonte de alheamento. Aquilo que possuímos ameaça de nos tragar. Os homens que vivem na zona do ter são almas cativas que sofrem uma deficiência ontológica com a perda do ser. Tais homens são indiferentes ao outro. Fogem no momento de perigo. Para o homem que vive na “dimensão do ter”, todas as coisas são problemas; para o que entra em “seu próprio ser”, convertem-se em mistério. O ser, já por si, é um mistério: não se pode comprovar, computar e dominar, mas apenas reconhecer.

Estava iluminado pelo espírito de Gabriel Marcel nosso imenso Oscar Niemeyer quando ensinou: “Meu avô foi Ministro do Supremo Tribunal Federal, morreu sem um tostão. Achei bonito ele morrer assim. Teria vergonha de ser um homem rico. Considero o dinheiro uma coisa sórdida.”

Também caminhou na contra-mão o poeta Newton Braga. Desprezou o pragmatismo, com os desvalores em que se assenta:”Esta sensibilidade, que é uma antena delicadíssima, captando pedaços de todas as dores do mundo, e que me fará morrer de dores que não são minhas.”

Segundo Gabriel Marcel qualquer tarefa humana, mesmo um artigo como este, pode ser um problema ou um mistério. Será um problema se for encarado como algo que me corta o passo, um gigante assustador com o qual devo me defrontar. Será mistério na medida em que me veja metido nele, na medida em que meu próprio ser nele se implique e se comprometa.

Joseph Beuys vê como obra de arte toda a criatividade humana: o professor, o cientista, o filósofo, o escritor, o jornalista, o revolucionário, o utopista são todos artistas. Dispondo do milagre da palavra, o escritor e o jornalista devem ser porta-vozes do seu povo. Devem estar a serviço da justiça e da verdade.

Está próximo o mundo dos homens que viverão na “dimensão do ser”. Já não será o gesto de coragem isolado, mas o fruto de uma estrutura social. Não se lutará pelo pão de cada um, mas pelo pão de todos. A oração do “Pai-Nosso” será verdadeira. O espectro da solidão será banido da terra.

Desatrelados do “pesadelo do ter”, os homens serão “livres para ser”. E a humanidade construirá sua casa, e ninguém ficará ao relento, e as crianças olharão as estrelas, e as estrelas terão paz, do jeito que Oscar Niemeyer sonhou.

2 comentários:

  1. Belo tema. Grata pelo Post.
    Fique bem, Norma

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    1. Ok Norma! Fico feliz que tenha gostado.
      Visite nosso blog sempre.
      Abração!

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